domingo, 13 de novembro de 2016

Capítulo 3



Nesta noite não dormi, simplesmente não consegui, afinal de contas eu já havia dormido por quatorze anos, mais de uma década perdida deitado nesta cama de hospital. O que eu perdi? Quem eu perdi? Demetria ainda me ama? Ela ainda me espera? E minha família? Meus pais estão bem? E meu irmão, meu Deus, meu irmão, o que Nick fez de sua vida? Ele já não é um moleque, mas ele estaria ainda irresponsável como antes ou teria se tornado um homem de vez?
Entro na sala do psicólogo que vai me atender, assim que o vejo, percebo que não quero falar com ele, eu simplesmente não conseguiria fingir que não sei se nada ou passar por várias consultas, eu quero sair daqui, rever a minha família.
_ Bom dia. – ele diz.
_ Bom dia. – respondo.
_ Joseph, eu sei que os últimos dois dias foram cansativos, eu não gostaria de lhe fazer passar por mais estresse, mas terei que lhe forçar um pouco...
_ Eu já sei que perdi quatorze anos da minha vida, pode pular esta parte. – digo e o pego de surpresa.
_ Quem lhe falou?
_ Não interessa. – digo um pouco bruto. _ perdão, eu não quero soar como um idiota, só que prometi que não falaria. – justifico-me.
_ Infelizmente você recebeu a noticia de uma forma que não é a mais correta, mas espero que possamos continuar nossas seções sem mais atrapalhações.
_ Porque preciso destas seções? – pergunto.
_ Foi quatorze anos, Joseph, muita coisa aconteceu. – ele diz. _ Você precisará se adaptar a um novo mundo.
_Eu só quero ver minha família, com o resto eu me adapto depois.
_ E você os verá, mas você foi dormir em uma década e acordou em outra, o mundo andou, as coisas não estão mais como antes, você logo poderá sair deste hospital, e eu preciso lhe preparar para o que vai encontrar.
_ Algo de ruim aconteceu com minha família?
_ Muita coisa aconteceu, coisas boas e ruins, Joseph, e não apenas com sua família. Acalme-se. Dê-me à oportunidade de lhe ajudar, percebo que você não está muito aberto a minha ajuda, mas eu preciso que você me dê uma chance. Você é um milagre, seus exames físicos e neurológicos foram ótimos, a única coisa que você precisará fazer, além de passar por mim, será a fisioterapia, para que você recupere os músculos que perdeu e assim volte a andar, volte a segurar coisas com sua mão, levantar seus braços sem ter que se esforçar tanto, todos os movimentos que lhe parecem quase impossível hoje em dia... Eu posso te ajudar na sua parte mental, mas isso só poderá acontecer quando você perceber que precisa se abrir, precisa permitir que eu o ajude.
_ Me desculpe. – peço. _ Eu... Não sei por que estou agindo desta forma.
_ Você passou por muita coisa, é compreensivo seu comportamento, uma das minhas funções é fazer com que tudo o que você terá que enfrentar daqui para frente, seja menos traumático. – apenas concordo.
_ O que mudou? – pergunto agora calmo.
_ O que não mudou? – ele sorri. _ Bom... Tudo bem, você provavelmente está querendo saber sobre sua família. – ele para alguns segundos. _ Sua família não é a mesma que você deixou.
_ Alguém morreu? – pergunto, segurando para não fraquejar. Ele não diz nada de imediato, apenas olha para alguns papeis em sua mão.
_ Talvez... – ele começa.
_ Isso quer dizer um sim, não é? Você não hesitaria em falar um não. – digo.
_ Eu não estou aqui para lhe dar notícias ruins, estou aqui para lhe preparar para as mudanças. – ele diz. _ E sim, talvez você tenha perdido alguns familiares.
_ Alguns? – deixo minha voz de desespero transparecer. _ Então mais de um morreu? – pergunto.
_ Eu não falei em morte, Joseph, há muitas maneiras de se perder pessoas... Foram 14 anos, você pararia 14 anos da sua vida, esperando por alguém, sendo que todos que estão a sua volta dizem que não vale a pena? – ele pergunta.
_ O que você quer dizer com isso?
_ As chances de uma pessoa acordar do coma após alguns dias são promissoras, após alguns meses pode acontecer, após um ano, é difícil, após o quinto, raríssimo, após do decimo?... Nenhum médico aqui acreditava que você acordaria, alguns familiares acreditavam que desligar as máquinas que o mantinha vivo, era a melhor opção, menos gastos, menos desgaste, menos sofrimento...
_ Queriam me matar?
_ Quase ninguém acreditava que você estava realmente vivo. – responde.
_ Minha mãe estava aqui...
_ Ela nunca deixou de acreditar.
_ Só ela?
_ Não, mas sem duvidas ela foi a que mais lutou para que mantivessem seu tratamento, contra tudo e contra todos, ela não iria deixar suas maquinas serem desligadas.
Minha conversa com o psicólogo não rendeu muito mais do que isso, e talvez eu devesse ficar feliz, pelo menos minha mãe estava ali.
Volto para o quarto e lá a enfermeira me alimenta com uma sopa, insossa, nada agradável de comer, mas como, estou com fome e preciso me recuperar o mais rápido possível.
 Assim que termino de comer, tenho minha primeira boa notícia dos últimos dias. Verei minha mãe.

Assim que minha mãe entra no quarto, vejo o quanto ela mudou, antes do acidente ela era uma coroa enxuta, cabelo castanho e liso, sempre arrumada; levemente cheinha, sem rugas, mas agora seu cabelo está com a raiz toda branca, seu cabelo parece grande e está amarrado. Ela tem muitas rugas e olheiras, está muito magra e sua boca está fina, ela veste um vestido largo, que parece caber duas dela dentro dele. Fico surpreso, seria apenas a passagem do tempo, ou seria eu? Eu a fiz sofrer e por isso o tempo lhe castigou tanto? Ela sorri e começa a chorar, ainda na porta.
_ Mãe. – eu digo, tentando ignorar sua clara mudança física, pois eu tampouco estava como antes, para ser bem sincero, eu estava bem pior, minha mãe pelo menos está de pé, magra, porém ainda tem seus músculos.
_ Meu filho. – ela vem até a mim e me abraça, vejo que ela não fica a vontade, pois tem que se curvar, já que estou sentado na cadeira de rodas. Ela me abraça forte e mesmo um pouco desconfortável, ela não me solta rápido.
Quando me solta ela começa a tocar meu rosto, minha testa, minhas sobrancelhas, minha bochecha, que agora está murcha, meu queixo...
_ É você meu filho. – ela chora. _ Você está acordado. – deixo-a chorar e me tocar o quanto quiser.
_ Eu estou mãe, eu estou acordado.

1 mês depois

Em um mês eu pude perceber muita coisa, uma delas é que Demetria não mais me esperava, ela não veio me visitar nenhuma vez e sempre que eu tocava em seu nome, minha mãe ficava nervosa e mudava de assunto. Também não vi meu pai, nem mesmo Nick, creio que minha mãe e meu pai se separaram, pois ela ficar chateada ao falar sobre ele. Segundo ela, Nick se mudou para longe, percebo que eles também não devem estar muito bem, pois ela também fica nervosa ao falar sobre ele.
Recebi algumas visitas de primos, e alguns amigos, meu tio, o que me contratou em sua empresa, foi o último a vir me visitar. Ele foi um pouco frio durante sua visita, e foi perceptível que ele e minha mãe não mais se davam bem. Ao sair do hospital eu teria muita coisa para descobrir.
Outra coisa que percebei foi que ir ao psicólogo não me traria notícia, pelo menos não da minha família. Porém sei sobre todos os presidentes que perdi: GorgeW. Bush e Barack Obama duas vezes, se bem que quando eu sofri meu acidente eu vi o primeiro ano de mandato de Bush, sei que Donald Trump será o nosso novo presidente. Sei quais são os novos ídolos da música, e quais são os novos estilos da moda, o que mudou muito, descobri novas gírias, mas nada me surpreendeu mais do que a tecnologia, nada mais de teclas ou celulares robustos, agora são finos e se eu quiser fazer algo eu toco na tela, imagina isso? Eu toco na tela, CD? DVD? Aparentemente quase ninguém mais compra CDs e o DVD foi substituído por Blu Ray, os computadores agora não são mais de CPU, mas sim notebooks, e segundo meu psicólogo até mesmo estes começaram a serem obsoletos. É tanta coisa...
Na fisioterapia descobri o quanto poder andar é algo valioso, depois de duas semanas finalmente consegui sair da cadeira de rodas, mas apenas para começar a usar o andador (e isso me fez sentir um velho). Agora já posso carregar coisas leves, como livros, copos, pratos, me alimentar, na seção de ontem eu consegui levantar por longos três segundos um peso de 2kg, o que deixou a todos muito felizes, principalmente eu.

2 meses depois

Eu já estava cansado, três meses dentro de um hospital não é algo fácil, minhas seções com o psicólogo estava ficando mais espaçadas, apenas uma vez por semana, já minha fisioterapia estava ficando mais e mais pesada. Eu pouco via o Doutor Jacob, mesmo ele quase sempre vindo me visitar depois de seu expediente.
Eu já não estava mais no andador, mas sim na muleta, mas os fisioterapeutas estavam começando minha transição para a bengala.
Eu ainda estava magro, mas agora estou forte, consigo levantar mais de 7kg de peso.

Nesses últimos três meses minha mãe ficou no hospital todos os dias, não demorou muito para ela revelar que não estava mais trabalhando.

Eu já conhecia praticamente a todos do hospital, de funcionários a pacientes. Eu claramente tinha perdido pessoas importantes na minha vida, mas aqui, nessas paredes brancas eu também havia conhecido pessoas que gostaria de levar para esse retorno de vida.

Faz apenas duas semanas que tive autorização para ver TV. E esta também mudou, as imagens tem mais resolução, tudo parece mais tecnológico.


Mais um dia amanhece e eu me preparo para a rotina que virá, porém antes mesmo do café da manhã, Jacob entra em meu quarto, fico surpreso, pois geralmente ele vem durante a noite.
_ Joseph, nosso homem milagre. – ele ri. Ganhei esse apelido por aqui, pois todos acreditam que o que aconteceu comigo (acordar do coma após 14 anos, sem sequelas sérias), é um milagre, e eu não duvido que seja mesmo. Eu até mesmo dei uma entrevista para o jornal local que se interessou pela minha história.
_ Olá doutor. – digo. _ Veio cedo hoje. – reparo.
_ Sim, vim cedo, mas existe um motivo especial, não estou aqui apenas como amigo, mas principalmente como seu médico. – ele diz.
_ O que aconteceu? – pergunto preocupado.
_ Nada de ruim. – ele não hesita em me acalmar. _ Trago boas notícias. – ele diz. _ Você ganhou sua alta, Joseph, você já pode voltar para sua casa.

Continua


Babii: triste mesmo, e como você disse, Demi não está mais com ele. Bom, agora Joseph tem 37 anos. Obg por comentar ;)

Diana: Sim, bem triste para ele, mas aos poucos ele vai se acostumando e vai descobrindo o que perdeu. Obg por comentar ;)

2 comentários:

  1. Aii a cada capítulo me apaixono mais por essa história quero saber como ele vai lidar como por exemplo pessoas da família que nasceram e morreram e como ele vai fazer pra seguir em frente sem a Demi por enquanto

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